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STJ: Acesso a herança digital deve ser feita por inventariante especializado

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Maioria da 3ª turma determinou que inventariante digital especializado faça a triagem dos arquivos, cabendo ao juiz decidir quais podem ser transmitidos e quais devem permanecer protegidos.

Nesta terça-feira, 9, a 3ª turma do STJ decidiu que o acesso à chamada herança digital deve ser realizado por inventariante especializado, ao analisar pela primeira vez a inclusão de bens virtuais armazenados no computador de herdeira falecida, inaugurando precedente no Direito brasileiro sobre sucessão de patrimônio digital.

Por maioria, o colegiado acompanhou o voto da ministra Nancy Andrighi e determinou que o processo retorne ao 1º grau para a instauração de um incidente judicial destinado à identificação e classificação dos arquivos armazenados em computador de herdeira falecida.

A turma estabeleceu que um inventariante digital, profissional capacitado e sujeito a dever de sigilo, fará a listagem minuciosa do conteúdo, ficando a critério exclusivo do juiz definir quais bens têm valor patrimonial e podem ser transmitidos e quais devem ser preservados por envolver direitos da personalidade.


Entenda

O caso decorre do acidente aéreo que, em março de 2016, matou o empresário Roger Agnelli, ex-presidente da Vale, sua esposa Andréia, os filhos João e Carolina, a nora, o genro e o piloto.

Com a comoriência (morte simultânea dos integrantes da família), uma das mães que assumiu a inventariança requereu autorização judicial para verificar o conteúdo do computador da filha, a fim de identificar eventuais bens, de valor econômico ou afetivo, que pudessem integrar o patrimônio.

O pedido visava tanto ativos com valor econômico, como obras literárias, direitos autorais ou arquivos valiosos, quanto bens de valor afetivo, como fotografias e registros pessoais.


Voto da relatora

Em seu voto, a ministra Nancy Andrighi, relatora do caso, destacou que a matéria é inédita no Direito brasileiro, sem precedentes ou doutrina consolidada.

Nancy ressaltou que, na ausência de senha de acesso, a abertura de um computador de pessoa falecida só pode ocorrer por autorização judicial, mas alertou que a liberação indiscriminada poderia expor informações íntimas, protegidas pelo direito da personalidade.

Para garantir segurança, a relatora propôs a criação de um incidente processual específico para a identificação de bens digitais, com a nomeação de um inventariante digital, profissional capacitado para acessar o conteúdo, manter sigilo e elaborar listagem detalhada do que foi encontrado.

A ministra ressaltou que caberá ao juiz, de forma indelegável, decidir quais bens são transmissíveis, como ativos financeiros, obras ou arquivos com valor econômico, e quais permanecem intransmissíveis por envolverem a intimidade do falecido ou de terceiros.

Nancy observou que muitos bens digitais vêm sendo perdidos no Brasil por falta de regulação e ressaltou que projetos em discussão no Congresso ainda não tratam do papel do juiz nesse contexto.

Ao final, votou por dar parcial provimento ao recurso, determinando o retorno dos autos ao 1º grau para processamento do incidente, classificação e avaliação dos bens digitais conforme os parâmetros definidos em seu voto.

Os ministros Humberto Martins, Moura Ribeiro e a ministra Daniela Teixeira acompanharam a relatora.


Voto-vista

Ao apresentar seu voto na 3ª turma do STJ, o ministro Ricardo Villas Bôas Cueva divergiu parcialmente da relatora, ministra Nancy Andrighi.

Cueva entendeu que a requisição de informações à Apple não configura questão de "autoindagação" a ser remetida às vias ordinárias, mas sim providência própria do inventário, já que o objetivo é identificar bens digitais de possível valor patrimonial.

Para o ministro, atos executórios necessários ao acesso desse acervo devem ser realizados no próprio juízo do inventário, ressalvando a possibilidade de incidente processual apenas para identificar e avaliar os bens digitais, com eventual apoio técnico.

O relator ponderou que a criação obrigatória de um "inventariante digital", como sugerido pela ministra Nancy, poderia esvaziar o princípio da sucessão universal previsto no Código Civil, além de gerar entraves práticos e alongar ainda mais os inventários.

Citando experiências internacionais, como decisões na Alemanha, Espanha, França, Itália e EUA, destacou a tendência de reconhecer a transmissibilidade da herança digital, inclusive de dados e perfis em redes sociais, aos herdeiros.

Para o ministro, não há razão para diferenciar bens digitais de bens analógicos, já que ambos se submetem às mesmas regras sucessórias.

Assim, votou pelo provimento do recurso especial, determinando o retorno do processo ao 1º grau para que seja expedido novo ofício à Apple e adotadas as medidas necessárias ao acesso aos bens digitais do casal, com a possibilidade de incidente processual apenas se indispensável à avaliação do conteúdo.

O ministro, no entanto, ficou vencido.


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    Image post: Professora é chamada de "vadia" três vezes em reunião de curso de Direito O episódio ocorreu na presença de professores, técnicos e alunos que participavam do encontro online.
    Ana Cristina Brandão 16/10/2025

    Professora é chamada de "vadia" três vezes em reunião de curso de Direito O episódio ocorreu na presença de professores, técnicos e alunos que participavam do encontro online.

    A vice-coordenadora da Faculdade de Direito da UFBA - Universidade Federal da Bahia, professora Juliana Damasceno, afirmou ter sido chamada de "vadia" três vezes durante uma reunião virtual da Congregação do curso, realizada em 6 de outubro. A ofensa, segundo ela, foi proferida pelo estudante Pedro Maciel São Paulo Paixão, presidente do CARB - Centro Acadêmico Ruy Barbosa, enquanto ela apresentava uma questão de ordem.O episódio ocorreu na presença de professores, técnicos e alunos que participavam do encontro online. Juliana tornou o caso público nesta quarta-feira, 15, por meio das redes sociais, afirmando que inicialmente ficou paralisada diante das agressões verbais, mas decidiu se manifestar para dar visibilidade ao ocorrido. "No legítimo exercício de um cargo de poder decisório e como servidora pública federal, enquanto suscitava Questão de Ordem sobre impedimento de membros da Comissão Eleitoral para participação no julgamento, fui alvo de ataque misógino, praticado pelo presidente do Centro Acadêmico Ruy Barbosa, Pedro Maciel São Paulo Paixão, por razões da condição do meu sexo feminino e, também, do exercício das minhas funções administrativas de natureza pública, com repetição agressiva e dolosa, e com evidente propósito ofensivo, por 03 (três) vezes, das palavras "vadia, vadia, vadia"(sic!), que já não fazem - ou não deveriam fazer - parte da linguagem masculina sã no século XXI, por resumir o seu decadente anacronismo. As gravíssimas ofensas estão carregadas do ranço da cultura patriarcal que nega a legitimidade da presença feminina em posições de representação e hostilizam, simbolicamente, todas as mulheres que lutam por reconhecimento, respeito e igualdade dentro da academia, do serviço público e nos próprios caminhos da sua existência." A professora, que atua há 20 anos como advogada criminalista, disse que buscará responsabilização do estudante nas esferas cível e criminal.